A Barraca revive 'O príncipe de Spandau' numa época de crescimento do discurso de ódio
A companhia A Barraca traz de volta a peça 'O príncipe de Spandau', refletindo sobre o aumento do apoio à violência e ao ódio político, desafiando artistas e públicos a confrontar essas questões.

A companhia de teatro A Barraca apresenta, a partir de quinta-feira em Lisboa, uma nova encenação da peça 'O príncipe de Spandau'. Esta reposição surge num momento em que se observa um crescente apoio a políticas de ódio e violência, algo que, segundo a atriz Maria do Céu Guerra, representa um desafio urgente para artistas e autores.
Maria do Céu Guerra, cofundadora da companhia, enfatizou à agência Lusa que decidiram trazer esta obra à cena meses antes, num claro sinal de resistência face a essa onda preocupante que os democratas pensavam extinta. "Os artistas têm a obrigação de reassumir a sua voz em defesa da paz e da liberdade", afirmou.
Originalmente escrita em 1987, a peça aborda a vida de Rudolph Hess, o destacado colaborador de Hitler, desde a sua condenação em Nuremberga até à sua morte em 1987. Hess, que ocupou uma posição de destaque no Partido Nazi, ficou notório por desempenhar um papel crucial na elaboração de leis racistas e na execução do Holocausto. Ele foi preso após uma tentativa infrutífera de negociar a paz durante a II Guerra Mundial.
Maria do Céu Guerra recordou que, na altura da primeira estreia, o mundo não enfrentava de forma visível a ameaça do nazismo. "A história da Europa é vasta e ainda temos muito a aprender com ela", sublinhou. Hoje, no entanto, o contexto assustador de extremismos e políticas discriminatórias é evidente e compromete a segurança dos cidadãos.
Sobre esta nova produção, a atriz adiantou que a abordagem à narrativa e as implicações da peça são agora ainda mais relevantes. "Embora se trate de uma ficção, 'O príncipe de Spandau' coloca em evidência as tendências raciais e o extremismo que permeiam a nossa sociedade contemporânea", disse.
A trama desenvolve-se no Quartel-General de Spandau, onde Hess, em sua loucura, continua a manipular os destinos do mundo, convocando líderes para formar o que imagina ser um renascimento do nazismo, mesmo em seus últimos momentos. "É fundamental que possamos refletir sobre o que essa percepção de 'novo' e 'renascente' acarreta", afirmou Guerra.
A nova produção, que promete ser provocadora, conta com o texto de Hélder Mateus da Costa e a interpretação de Gil Filipe. As sessões de estreia ocorrem nos dias 19 e 20 de outubro, e a peça estará em cena até 27 de julho, com uma programação diversificada.
A Barraca mantém o compromisso de abordar assuntos relevantes e polarizadores, dedicando-se a temas que ressoem com as inquietações do presente. "Os atores e dramaturgos comprometidos buscam dar voz a vozes que precisam ser ouvidas na sociedade", concluiu Maria do Céu Guerra.